Da vide recebi muito; vinda de família humilde onde nunca se ouvia falar em faculdade,outros Países,outras culturas,musicas clássicas,olimpíadas.
No máximo o que ouvíamos e viamos encantados era um filme no cinema e eu curiosa buscava nos livros tudo o que podia ,queria,sonhava.
Na minha casa pequenina para abrigar tantos filhos e mais agregados nunca nos faltou amor,carinho,alimentação.
Nossos pais trabalhavam até a exaustão, não sobrava tempo para sonharmos juntos . A prioridade era maior,alimentar,abrigar,medicar. Éramos10 filhos e minha mãe trabalhava muito.
Quando a noite chegava e os pequenos iam dormir,ela amassava o pão , fazia os bolos costurava pela noite afora até o amanhecer.
Mau pai trabalhava a madrugada toda e chegava pela manhã, para recomeçar a jornada após 12: 00 horas.
Tempos difíceis e mágicos, tínhamos pouco mas, aquilo se multiplicava, da comida ao abrigo, minha mãe se tornava ma~e do mundo e todos os amiguinhos dos meus irmãos queriam ficar lá em casa, que minha mãe costurasse as roupas iguais as nossas e morávamos num bairro central , com casas belas e gente rica.
Domingo era um dia especial, íamos todos para a cama com papai e cantávamos ou apenas o ouvíamos cantar, suas canções tristes da lua, do passarinho na gaiola, das caveiras que se amavam, da Iracema , meu pai fazia trocadilhos e era um homem maravilhoso e alegre, adorava ler e cinema e me levava para assistir todos os filmes, os de Cristo , Hércules, Sansão, eu vi todos , como ele suportava ficar sentadinho vendo filmes, nem dormia aquele Menino Guerreiro ...
Um dia descobri, no cinema , ele podia dormir e nenhum filhinho pequenino poderia acordá-lo ...eu já era maior , ficava quietinha embevecida com os filmes.
Eu era uma adolescente e não entendia o porquê de tantos filhos ..tanto sacrifício ..tanta luta pela sobrevivência .
Nossas roupas eram brancas de um branco tão alvo , tão imaculadamente limpo e nossos uniformes eram engomados, ficavam durinhos. E as panelas tinham um brilho jamais visto, pareciam espelhos e as mãos calejadas da minha mãe tricotavam, bordavam, lavavam, engomavam, passavam, enceravam, limpavam os vidros, e costuravam para todos. Difícil entender a alquimia a roupa velha, muitas vezes que ela ganhava , transformava na nova e linda.
Eu inquieta e pequenina fui buscar um trabalho, precisava ganhar o meu sustento . Era mocinha e queria tudo.
Tinha um gosto super apurado ,ninguém sabia de onde vinha o dom de decorar os pratos, arrumar a mesa, me vestir , pentear .
Eu sabia distinguir o fino e belo dentre mil peças.
E gostava de música clássica, piano, esgrima, equitação, balé clássico.
Ironia do destino , como podia gostar de tudo que não fazia parte do meu mundo , mas, para sonhar não era necessário se ter dinheiro, nem nome pomposo.
Era uma autentica adolescente, aos 13 anos fui procurar trabalho em uma fábrica e comecei a trabalhar desde então para nunca mais parar .
Aprendi muito, para conseguir transferir meu antigo colegial para o noturno,tive que mentir, falei ao diretor que meu pobre pai, sofria de um reumatismo e não podia caminhar e minha mãe não poderia deixar as crianças para assinar minha transferência para o turno da noite e o Diretor penalizado me transferiu sem problemas.
Comecei minha maratona em uma fábrica de um produto de beleza,dobrava bulas.
Saía de casa as 5:00 horas no meio da geada de Curitiba e retornava as 11:00 horas da noite.
Era tão pequenina, pesava 36 kg.começaram a me chamar de Pinguinho de Gente e fui das bulas ao escritório,do escritório a gerente da fábrica,tudo antes dos 16 anos.
Abria a fábrica as 06h30 hora.Trabalhava com meninas de fábrica, as famosas operárias doces e meigas criaturas , pobres de dinheiro e sonhos, sem expectativa , sem estudo e ouvi muita música caipira ( na época não se falava sertaneja ) . Eram lamentos tristes , de corações sem esperança mas havia um quê de verdadeiro, autentico , brasileiro. Uma verdade maravilhosa e doída . Eram todas muito jovens, cujo único sonho era casar, ter um lar, um marido e muitos filhos.=, a famosa prole tão bem descrita nos livros de Karl Marx.
Eu tinha que estudar, crescer, eu deveria me chamar Ansiedade, queria saber , aprender, estudar, evoluir.
Os horários não me faziam desanimar, ao contrário, levantava 02 horas antes para me preparar para o trabalho,com tanto esmero e capricho como se fosse a um baile !
O dono da fábrica não demorou a me notar e foi me promovendo ,eu fazia sempre o melhor ,cada dia buscando me superar .
Lindos dias !
Mas meu chefe começou a me notar demais eu era criança mas sabia o meu lugar , o que queria . Era uma profissional responsável ,não admitia ganhar mais do que minha função permitia e tinha orgulho do meu trabalho e sabia que poderia fazê-lo com perfeição em qualquer outro lugar. Não ficaria aos sobressaltos com a aparição daquele homenzarrão imenso e não me deixaria vender por dinheiro algum.Naquele tempo aquilo era sedução, crime e ninguém comentava, era normal.Um velho de 30 e poucos anos assediando uma menina de 16 aninhos, eu senti nojo, era menina normal. Sabia impor respeito e fiz isto pela vida afora. Tive que provar a todo instante a minha capacidade como profissional .
Vinda de uma geração onde as mulheres estudavam pouco, no máximo o magistério, educadas para casar, gerar filhos e fazer o circo funcionar .
Fui além, eu e toda uma geração,conseguimos igualdade de direitos ( pelo menos é o que pensávamos ) , na realidade conseguimos acúmulo de tarefas ,triplicar jornadas de trabalho, casar ,trabalhar , gerar , pagar contas , estudar .
Evoluímos é verdade, hoje temos acesso a várias culturas, estudo, mestrado,doutorado, MBA . Entramos na Nasa, pilotamos aviões, carrões mas também pilotamos os fogões , já temos lavadoras de roupa mas continuamos à acionar os botões, separando as roupas, estendemos, passamos , guardamos,cozinhamos, lavamos as louças , limpamos, educamos , somos mães , amigas , irmãs, enfermeiras, psicólogas,treinadoras, professoras, e profissionais .
Temos que ser Super Star . Super Mãe .Super Esposas.
O circo está armado só que ganhamos neste palco o papel principal “o de palhaça “. Temos que fazer sorrir,embora estejamos aos prantos internamente.
Nossa solidão sufoca , noites eternas,os dias passam ,o trabalho preenche, as noites tem 24 horas.
Somos respeitadas como profissionais , independentes, compramos nosso veículo, nossa casa , pagamos nossas contas. Nossos filhos vão para o colégio sem nem ao menos saber balbuciar , mas nós elegemos presidentes. Ganhamos cargos nos mais altos escalões, somos promotoras , juízas, ministras, presidentas.
Os homens se assustam com tanta independência, tanto profissionalismo, tanta dedicação. Não fazemos corpo mole, as cólicas são coisas da vovó se adoecemos é preciso ser algo muito grave para nos fazer ficar numa caminha ou num leito de hospital.
Tivemos que provar tanto a tanto tempo que não temos o direito de adoecer. Se engravidamos, nossos bebes nos dão mais forças e nosso trabalho é multiplicado .Nada de enjôos , vômitos , desmaios . Tudo isto é coisa do passado.
O mal que nos atinge é o mesmo dos homens , infarto , ansiedade , AVC .
Quando damos a luz, deixamos nossos bebes com a babá , ou a vovó ou num berçário ,até com o Papai , mas, não deixamos nosso posto.
A princípio isto me deixava muito angustiada,parecia que estava abandonando meus filhos, mas, a vida não é de brincadeira e criança precisa de muito amor, comidinha , roupinhas , um teto , médicos , medicamentos . O custo é alto e o amor sem alimentação leva a mortalidade infantil .
Portanto, o trabalho passou a ser o tudo nas nossas vidas ,nossa alegria ,nosso sustento ,o lazer , a escola , a faculdade , o médico , a qualidade de vida.
Os passeios,os bons momentos em férias , tudo gira em torno do fruto do trabalho .E, sem trabalhar o que nos resta ?
O nada !!!!
Somos seres vegetando ,esperando um amontoados de dias passar . E a glória de uma conquista, um novo cargo, uma nova tecnologia.
Como viver,se atualizar,crescer ,evoluir sem um trabalho e a dignidade !
Tudo nos leva ao trabalho .
Cresci trabalhando,me doando cada vez mais.
Casei tarde para os padrões da época ,25 anos e continuei minha luta,trabalhando muito.
Meus filhos hoje são jovens adultos, dois homens e uma menina que é uma guerreira, cheia de ideais e sonhos, hoje jornalista, a pequenina acabou a faculdade!
Eu não tenho dúvida que se de um lado faltou tempo,do outro, sobrou qualidade .
Ainda buscam seu caminho,são muito jovens e no Brasil um jovem sofre muito para se colocar no mercado,para conseguir um trabalho que dignifique, um trabalho deve trazer prazer e a conseqüência é o dinheiro , mas como é difícil quando não se tem um Quem Indicou ...o mundo hoje é feitos de indicações, cabides de emprego, política, igual nos anos de 1.500, quando o Brasil começou, nada mudou!
Hoje a concorrência é imensa, superarão , para isto foram criados e serão felizes.
Cresci ...casei e estou casada com o mesmo homem já fazem 30 anos .
Se fui feliz no casamento ?
Estamos vivendo...viver é aprendizado constante, falta romantismo, flores, datas , água para molhar a plantinha.Já fiz de tudo. Hoje simplesmente vivo,trabalho, e estou terminando a faculdades de direito , realizando um sonho antigo ou presente, nem sei Só sei que não me deixei levar pelas armadilhas do tempo, a idade, me sinto com 18 anos e estou realizando um sonho impossível quando era jovem.
Não dancei balé , mas estou dançando no direito, estou vivendo entre jovens , sonhando juntos, fazendo planos, tomando as rédeas do meu destino nas minhas mãos e se o Senado não aprovar a lei funesta que só faz magistratura quem possui 10 anos de trabalho na área, ainda poderei ser juíza ou promotora ..não sei...são tantos os sonhos, sou jovem ainda...tenho todo o tempo...
Para se morrer é necessário se estar vivo e este é o risco que todos correm, não importando a idade, classe social, status, títulos ...todos um dia ou outro farão a passagem, e irei lutar muito, tanta vida, tanto para fazer ....
Se meu marido foi feliz ?
Viveu a seu modo como sempre, o tempo não passou continua o mesmo .
Os filhos cresceram , o mundo evoluiu,Ele está na dele,meio triste, meio feliz !
As vezes sorri ..outra grita ,mas nada de novo .Tudo como já era em 1979.
Acredito que sua voz se alterou um pouco mais e a teimosia também . Acredito também que para ele não tem sido fácil ... Viver ao lado da mesma família à tantos anos , vindo de origens tão diferentes das nossas . Até que está indo bem !
As vezes penso que gostaria de voar e somos suas amarras .
Gostaria de dar uma guinada de 1.000 graus profissionalmente e ver o dinheiro entrar em grande quantidade . Daí tiraria cada nó destas amarras e o deixaria voar longe,leve, solto e feliz !
Ninguém é de ninguém .Somos livres,seres livres em evolução e cada qual na sua busca individual !
Gostaria de vê-lo fazendo a sua busca,devagar e sempre, mas, feliz !
Relacionamento é algo sério; onde cada um cede um pouco para que exista harmonia . É um ceder constante. Um quer ir ,outro quer ficar .
Eu quero correr ...ver...ouvir..ler ..conhecer...buscar novos horizontes . dançar , cantar , ouvir músicas . Quero voar como andorinha .
Ele quer um carro mais veloz,uma TV maior,uma geladeira cheia de cerveja,vários domingos,várias pescarias,mar,barcos ...
É complicado o viver mas vamos levando ...Um dia o barco atraca ou afunda ...
Que sobre dignidade,amor próprio e um pouco de respeito e quem sabe carinho .
Pelo menos para que nossos filhos não sofram !
Eu já tentei de tudo,mas, fiquei cada vez mais, embora as vezes tenha vontade de sair e nunca mais voltar !
Mas depois lembro dos meus filhos,da minha neta que já chegou, Isadora, a estrelinha mais cintilante da vida ...não tenho o direito de deixar minha neta sem avós . Os avós são os pais com mel , açúcar . E quero minha família unida .
Se doer muito,dói em mim,nos meus sonhos perdidos,na vida que não vivi.
Suportarei tudo por lindos sorrisos em rostos amados.
O que seria do mundo se ninguém preservasse a família . O que seria ?
O Circo da vida continua, sou a protagonista ...vou colocar meu nariz de bolinha!
Estou viva ,respiro, vou me formar,sou feliz !!!
Senhoras e Senhores ...
O Circo Brasil apresenta:
O Maior Espetáculo : A Vida .
Agora sob “Nova Direção”
Flor do Córrego
